As propagandas comparativas são aquelas do tipo que confrontam/comparam o produto ou serviço de uma marca com o produto ou serviço de seu concorrente.
No Brasil, a propaganda comparativa é permitida (Artigo 32 do Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária), no entanto, para que ela seja considerada legal, alguns princípios e limites devem ser respeitados.
A propaganda comparativa é legal desde que:
- seja realizada de forma objetiva com o intuito de esclarecimento ao consumidor;
- a comparação alegada ou realizada entre os produtos/serviços seja passível de comprovação objetiva;
- não se estabeleça confusão entre produtos e marcas concorrentes, e;
- não deprecie a imagem do produto ou à marca da empresa concorrente.
Vale lembrar ainda que a Lei de Propriedade Industrial classifica como Concorrência Desleal a propaganda que:
- publica, por qualquer meio, falsa afirmação, em detrimento de concorrente, com o fim de obter vantagem;
- presta ou divulga, acerca de concorrente, falsa informação, com o fim de obter vantagem;
- emprega meio fraudulento, para desviar, em proveito próprio ou alheio, clientela de outrem;
Assim sendo, não há ilegalidade em campanhas publicitárias agressivas, desde que a informação seja “verdadeira, objetiva, não enganosa e não abusiva”. Portanto, para se ingressar com uma ação de concorrência desleal alegando publicidade enganosa, o autor terá que provar em juízo que o conteúdo da publicidade comparativa é falso, e que não há critérios objetivos na comparação dos produtos e serviços das empresas.
Nem sempre a empresa ou a marca do concorrente na propaganda comparativa é utilizada de forma pejorativa ou depreciada mas será necessário provar que os consumidores poderão ser enganados com o anúncio, seja pela falta de critério objetivo na comparação dos produtos ou serviços ou pela confusão entre produtos e marcas concorrentes.
Caso Uber X 99
Um exemplo de propaganda comparativa que a princípio foi considerada lícita em juízo ocorreu em maio de 2018. O caso se refere à ação interposta pela Uber face à concorrente 99, requerendo a suspensão liminar de publicidade comparativa no Rio de Janeiro, entre o serviço 99POP com o serviço de aplicativo Uber. A ação foi pautada por concorrência desleal, sob alegação de que se tratava de propaganda enganosa.
A empresa Uber justificou que a comparação de preços das duas concorrentes não era real, porque valores oscilavam conforme a oferta e a demanda em cada aplicativo. No entendimento da Uber, a 99 apresentou os preços como se fossem fixos, e induziu os consumidores a erro por considerarem que as tarifas do serviço 99POP seriam sempre menores. Assim, a oferta dos serviços 99POP em comparação com os serviços da Uber seria propaganda enganosa.
Em sua defesa no processo, a 99 declarou que não haveria ilegalidade na publicidade comparativa porque a empresa teria se pautado em critérios objetivos, sem denegrir ou ofender a empresa Uber e sua marca. A 99 também argumentou que o objetivo da campanha era estimular os consumidores a baixarem os dois aplicativos, e compararem as tarifas de cada empresa.
Em primeira instância¹, em 05 de junho de 2018, a juíza Maria da Penha Nobre Mauro, da 5ª Vara Empresarial da Capital do Rio de Janeiro, não concedeu a tutela de urgência (liminar) requerida pela Uber, e decidiu pela legalidade da propaganda comparativa e manutenção da campanha publicitária da 99.
A Uber recorreu ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro² para tentar reverter a decisão que negou a liminar, mas a desembargadora Denise Levy Tredle, da Vigésima Primeira Câmara Cível, na data de 18 de junho de 2018, também decidiu em favor da 99, mantendo a publicidade. De acordo com a Desembargadora, “não há ilegalidade na publicidade comparativa desde que as informações sejam “verídicas, objetivas e não abusivas”.
Ainda de acordo com a magistrada, as duas partes apresentaram atas notariais para comprovar suas alegações. Diante disso, ela declarou que seria necessário a realização de prova pericial para “embasar a correta solução da controvérsia”.
Assim, conclui-se pela legalidade da prática de propaganda comparativa, desde que seja feita com critérios objetivos, verdadeiros, não pejorativos e sem gerar dúvidas nos consumidores sobre o resultado da pesquisa, sem a ocorrência de confusão entre produtos e marcas concorrentes.
Neste caso específico, as empresas Uber e 99 resolveram o conflito através da homologação de acordo judicial, protocolado na Justiça do RJ em 14 de junho de 2019. Com base neste acordo, a campanha publicitária envolvendo Uber e 99 seria retirada de circulação, sendo que o presente acordo não implicou no reconhecimento pela Uber da legalidade da prática de comparação de preços, nem reconhecimento pela 99 da ilegalidade desta prática.
Portanto, caso sua empresa tenha dúvidas sobre a legalidade de uma campanha publicitária cujo objetivo seja a propaganda comparativa entre produtos e serviços de seus concorrentes, Ricci Propriedade Intelectual poderá assessorá-lo adequadamente, verificando cuidadosamente os elementos presentes na propaganda comparativa.
¹ Processo originário: 0126092-88.2018.8.19.0001, em trâmite perante à 5ª VARA EMPRESARIAL da Capital do RIO DE JANEIRO.
² Processo n°: 0029929-49.2018.8.19.0000, recurso de AGRAVO DE INSTRUMENTO, em trâmite VIGÉSIMA PRIMEIRA C MARA CIVEL do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.
Por Carlos Eduardo Neves de Carvalho